As aves marinhas são o grupo de aves mais ameaçado do mundo, enfrentando perigos tanto nas colónias em que nidificam, como no mar, onde passam grande parte da vida. Na SPEA, temos trabalhado de forma próxima com os pescadores para percebermos de que forma podemos minimizar o impacto de uma das ameaças que enfrentam – as capturas acidentais na pesca.
Imbatíveis no ar e no mar
Pairando sobre as ondas, as aves marinhas passam grande parte do seu ciclo de vida no mar, a alimentar-se ou a explorar novos territórios. Viajantes natas, estão extremamente adaptadas à vida em alto mar – o corpo fusiforme e aerodinâmico permite-lhes voar agilmente entre ondas, confere-lhes uma vantagem enorme para mergulhar e, assim, se alimentarem; utilizam o vento de uma forma que lhes permite voar com poucos gastos de energia; penas impermeáveis; patas com membranas interdigitais, permitindo-lhes nadar. São verdadeiras ‘máquinas’ a superar os rigores do mar, sobretudo durante os períodos de migração, em que num só dia podem viajar até centenas de quilómetros.
As aves marinhas vivem dezenas de anos, mas, até atingirem a maturidade sexual podem demorar entre quatro a sete anos, dependendo das espécies. Muitas delas reproduzem-se apenas uma vez por ano e põem apenas um ovo. Para espécies como estas, com uma vida longa, baixa fecundidade e maturidade sexual tardia, as ameaças com maior impacto na espécie são as que afetam a sobrevivência dos adultos – precisamente o caso da captura acidental.

Ameaças no mar
Apesar de voarem livremente pelo mar, sem grandes predadores, nem tudo é fácil quando chega a altura das aves marinhas se alimentarem. Tal como os pescadores, estas aves deslocam-se para os locais onde há mais peixe – os pescadores até as vêem como um aliado na altura de pescar. Mas as redes e anzóis, quando submersos tornam-se uma ameaça que pode ser fatal.
No caso das redes, quando submersas são invisíveis não só para as aves, mas também para mamíferos e répteis marinhos, que ao irem ao encontro do manancial de peixe, podem acabar por ficar presos ou enredados, sem escapatória possível. Já no caso dos anzóis, o problema não é serem invisíveis, mas sim, terem algo (peixe) que as atrai.
Em Portugal, começámos a trabalhar nesta problemática em 2010, através do projeto LIFE+ MarPro, tentando perceber o impacto das pescas na pardela-balear. Entre 2014 e 2019, com o projeto LIFE Berlengas, recolhemos informação abrangente sobre este problema na Zona de Proteção Especial (ZPE) das Ilhas Berlengas, percebendo-se quais as espécies mais prejudicadas e que artes constituíam um perigo maior para elas. Demos continuidade a estes trabalhos através do projeto MedAves Pesca, implementado algumas medidas de mitigação na ZPE das Berlengas.
Aliados pelo mar
Projetos como estes só são possíveis graças à colaboração estreita com os atores principais deste enredo: os pescadores. Na verdade, eles são os primeiros a reconhecerem o problema, que tem impacto sobre a sua atividade, e têm-se mostrado abertos e cooperantes para testarem soluções que lhes permitam continuar a pescar, sem causarem danos a outros animais.
Desde 2012, a SPEA tem vindo a implementar um sistema de observadores a bordo, através do qual técnicos experientes acompanham os embarques de pesca e registam as interações das aves marinhas com as pescarias. Esta é uma das formas para melhor se perceber o problema, mas não a única. Através de inquéritos aos mestres de pesca, tem sido possível conhecer melhor a dimensão desta ameaça, em alturas em que não é possível acompanhar os embarques. Graças a este trabalho conjunto, sabemos hoje que as artes de pesca com maior impacto nas populações de aves marinhas são as redes de emalhar, palangres e redes de cerco. E é nesta colaboração que, pescadores e cientistas, em diálogos e partilhas, conseguem perceber o que pode atrair mais aves e que soluções implementar.

Soluções simples
As medidas de mitigação da captura acidental devem ser eficazes na redução da captura acidental de aves e, ao mesmo tempo, ser práticas e fáceis de implementar, não devendo provocar perdas nas capturas de pescado. O que se pretende com uma medida de mitigação é que ela reduza a atração pelas redes e anzóis ou afaste as aves da imediação das embarcações. No projeto MedAves Pesca propusemo-nos testar algumas formas para evitar que as aves fossem capturadas nas redes e anzóis, e os resultados foram animadores.
Primeiro, testámos luzes LED, que ajudam a sinalizar as redes, permitindo torná-las mais visíveis para as aves marinhas. Outra medida utilizada foi o papagaio-afugentador, uma espécie de papagaio de papel em forma de ave de rapina – este, ao mover-se no ar, assemelha-se a um predador, afastando as aves das embarcações.
Apesar de as luzes não terem apresentado resultados promissores, o papagaio-afugentador revelou-se uma medida que, além de ser eficaz, é fácil de implementar e financeiramente acessível.
Próximos passos
Para continuarmos este trabalho de cooperação tão importante, precisamos de aumentar a capacidade de trabalhar com mais pescadores e expandir a implementação destas medidas a outras áreas do país. Lançamos recentemente a campanha STOP Bycatch e estamos a apelar aos vossos generosos contributos – para que a pesca em Portugal seja uma pesca mais sustentável e com futuro, ajudando as aves marinhas.