Arranca hoje a conferência de Biodiversidade da ONU, COP15, em que governos de todo o mundo tentarão definir um quadro global de biodiversidade. Este acordo irá substituir o Plano Estratégico para a Biodiversidade 2011-2020, que se demonstrou incapaz de travar o declínio devastador da biodiversidade do nosso planeta. É imperativo que as nações se comprometam a liderar ações concretas para travar e reverter a crise da biodiversidade, criando um quadro que respeite, proteja e assegure o direito humano a um ambiente saudável para todos – e Portugal tem de contribuir para esse desfecho.

 

“Se o Estado Português não sair da COP15 a implementar políticas financeiras efetivas de proteção e restauro ecológico, então o futuro da biodiversidade e dos serviços de ecossistema em Portugal é incerto. Se Portugal e a União Europeia não fizerem o que deve ser feito pela natureza e pelas pessoas, então como podemos dizer a países com menos meios económicos para o fazerem? Não falta conhecimento e dinheiro para salvar a biodiversidade, o que falta é vontade política para cortar com os interesses de curto prazo instalados.” diz Domingos Leitão, Diretor Executivo da SPEA.

 

Para garantir que travamos a extinção de espécies, é crucial que os líderes mundiais se comprometam com medidas concretas para salvaguardar, proteger e interligar os ecossistemas e áreas importantes para a biodiversidade que ainda nos restam, bem como para restaurar ecossistemas degradados e garantir que as áreas protegidas são geridas de forma eficaz e equitativa.

 

O combate às alterações climáticas e o desenvolvimento sustentável devem fazer-se através de soluções baseadas na Natureza, combatendo os usos insustentáveis da terra e do mar, redireccionando subsídios nocivos e assegurando financiamento equitativo para a conservação da biodiversidade.

 

Em Portugal, esses compromissos dependem não só dos organismos do Ministério do Ambiente, mas também da Agricultura, Florestas e Pescas, pois muitas das políticas de proteção da natureza e restauro ecológico terão de ser aplicadas e financiadas por esses sectores.

 

O Ministério da Agricultura terá de tomar as decisões políticas de investir parte dos 9 mil milhões de euros da Política Agrícola Comum (PAC) em medidas efetivas de apoio à biodiversidade rural e florestal. As espécies e os ecossistemas dependentes de gestão agrícola são os mais ameaçados da Europa. Este problema não existe por falta de conhecimento, nem por falta de dinheiro, uma vez que a PAC abarca 40% do orçamento comunitário. É preciso de uma vez por todas colocar dinheiro nos agricultores e nas práticas agrícolas e pecuárias que protegem a natureza, criam emprego e valorizam o território.

 

Igualmente importante é investir dinheiro do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura (FEAMPA) nos pescadores e nas pescarias que aplicam métodos para evitar a captura acidental de aves e mamíferos marinhos, e nas aquaculturas que não apliquem sistemas que matem aves e outros animais.

 

“É para isso que servem os fundos públicos, para reduzir o impacto destas atividades nas espécies e na Natureza”, frisa Domingos Leitão. “A tão famigerada bazuca europeia, o PRR [Plano de Recuperação e Resiliência], não pode financiar projetos de impacto severo na natureza, como a projetada barragem do Pisão e os 50 mil hectares de regadio associados ao projeto.”

 

Os fundos do PRR devem ser aplicados no restauro ecológico de rios, ribeiras e outras zonas húmidas, para criar emprego e valorização do território, em vez de editar no Alto Alentejo a destruição ambiental e humana produzida pelo Alqueva e a agricultura destrutiva.

 

Portugal tem de deixar de fingir que faz proteção da natureza, começando por interditar qualquer construção (empreendimentos turísticos, aeroportos ou outros) em cima da linha de costa e das grandes zonas húmidas. O nível do mar está a subir, e vai subir mais, e necessitamos destas zonas livres de betão para a natureza e as pessoas se poderem adaptar.

 

“O Governo de Portugal tem de colocar mais dinheiro dos vários programas comunitários e nacionais, como o Fundo Ambiental, na proteção da natureza”, diz Domingos Leitão. “E não se trata só de construir passadiços e outros equipamentos de visitação, trata-se de restaurar habitats fundamentais, como a floresta Laurissilva, as zonas húmidas, as dunas e outros habitats costeiros”, conclui.